Clipagem
02.10.2001 Do e-mail para as estantes Nos �ltimos tr�s anos, oito amigos se dedicaram a um fanzine online que foi longe. O Cardosonline come�ou como uma iniciativa de colegas de faculdade p�blica em Porto Alegre que resolveram n�o cruzar os bra�os na primeira greve que tiveram pela frente. A coisa come�ou como uma brincadeira: trocar contos, coment�rios e �egotrips� por e-mail. Em 2001, eram cerca de 5000 assinantes de todo o pa�s recebendo espontaneamente � coisa rara no mundo virtual de hoje � textos brutos semanais pelo correio eletr�nico. No m�s passado, eles resolveram dar fim � empreitada para seguir seus projetos pessoais. Vida que segue, tr�s deles resolveram fazer o caminho inverso da mar� convencional: deixaram a internet para trabalhar com o bom e velho papel. Daniel Galera, Daniel Pellizzari e Guilherme Pilla se juntaram para montar a editora Livros do Mal, com a inten��o de publicar aquilo que n�o encontravam no mercado. Com o nobre objetivo, dois bons livros de contos debaixo do bra�o e disposi��o para encarar sozinhos todas as etapas da produ��o editorial, eles foram disputar o patroc�nio do fundo de apoio � arte da prefeitura de Porto Alegre (Fumproarte) e sa�ram com o primeiro lugar. Com o dinheiro, editaram �Dentes Guardados� e �Ovelhas que voam se perdem no c�u� � respectivamente de Galera e Pellizzari � e agora batalham para dar visibilidade para a pequena empresa fora do Rio Grande do Sul. As armas para o desafio s�o simples e j� se mostraram eficientes no Cardosonline: propaganda boca a boca � ou �mail a mail� � e divulga��o em congressos de Comunica��o Social que se realizam anualmente pelo pa�s. Mas � bem verdade que algumas facilidades da rede v�o fazer falta. A principal delas � a comunica��o com os leitores. �J� teve gente me falando que teve uma experi�ncia diferente ao ler meus contos numa vers�o impressa. � bom ouvir esse tipo de opini�o, pois na internet o contato com o leitor se d� a todo o momento, o que n�o acontece com os livros�, explica Galera. Em rela��o ao conte�do, a experi�ncia dos dois autores mostra que pelo menos nesse caso, o meio n�o � a mensagem. �A internet � apenas um espa�o, um meio de divulga��o barato e simples. H� textos que s� funcionam para a web, mas nosso caso n�o era esse, tanto que aproveitei muitos dos contos que publiquei no Cardosonline no livro�, observa ele. Para Pellizzari, a rede tamb�m testemunhou o renascimento do conto e a perda de popularidade do romance como forma narrativa. �Desde os anos 70 se observa uma decad�ncia da palavra escrita, mas a internet acaba fazendo ela voltar com for�a. H� v�rios contistas novos surgindo por a�, e ano que vem pretendemos receber originais para dar espa�o para essas pessoas�, planeja ele. Os tr�s editores podem n�o ter descoberto a p�lvora, mas conseguem explicitar nos dois primeiros �livros do mal� as quest�es e situa��es vividas por uma gera��o que n�o est� acostumada a se ver retratada � e muito menos a se auto-retratar � em livro. Talvez por parecer se identificar mais facilmente com a internet, a TV e o cinema, ela acaba menosprezada pelas editoras convencionais e ganham o injusto r�tulo de iletrada. O fanzine virtual j� foi uma amostra de que essa vis�o est� equivocada, como afirma seu texto de apresenta��o: �O sucesso do COL mostra que a internet n�o � um palco exclusivo da subliteratura. Pelo contr�rio, � um vasto e democr�tico laborat�rio onde escritores podem levar sua produ��o ao p�blico, debater, experimentar. O COL prova que ainda existem leitores genu�nos numa �poca (...) em que supostamente ningu�m mais l�, onde a informa��o deve ser telegr�fica, em que a elabora��o visual importa mais do que aquilo que est� escrito. Com seus 70kb de texto puro em duas edi��es semanais, ele demonstra que tem muita gente por a� lendo e, sobretudo, escrevendo�. Depois de tudo isso, quem vai duvidar do sucesso deles no papel?
A distribui��o da Livros do Mal pode n�o contar com grandes estrat�gias, mas o conte�do dos seus dois primeiros livros tem m�rito para fazer a cabe�a de jovens de todo canto. Os textos s�o simples, diretos e expressam agonias e quest�es que s�o consenso sem passar perto de clich�s. Num conto de �Dentes Guardados�, a residente em medicina se d� conta de que est� cansada da rotina quando perde o caminho para o hospital e s� sai do �transe� quando pede uma cerveja num quiosque. Num de �Ovelhas...�, um rapaz que se finge de maluco e engana a m�e para n�o deixar o hospital psiqui�trico. Diante das tantas paix�es, incertezas e medos da vida moderna que os livros explicitam, fica dif�cil mesmo n�o relativizar a loucura.
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Todos as ilustrações � Copyright 2001-2003 Guilherme Pilla de Araújo. Porto Alegre, RS, Brasil. |